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O avanço da extrema direita e a criminalização das vítimas de estupro

O avanço da extrema direita e a criminalização das vítimas de estupro

A reação ao PL 1904 ganhou as ruas. O Presidente da câmara, que colocou em caráter de urgência esse projeto, recuou, tentou minimizar os efeitos e garantiu que será debatido e passará pelas Comissões no 2° semestre. Uma vitória do movimento! Elegemos um governo que é refém do centrão, que retira direito das mulheres e impõe uma crueldade às vítimas de estupro. A mobilização deu o tom da luta. É preciso fortalecer o movimento de mulheres para garantir os direitos e avançar nas conquistas.

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Coletivo de Mulheres do Partido Comunista

Vivemos tempos de crise profunda do capitalismo. Desde 2008, vemos o Capital, em crise, utilizar a ferramenta mais sórdida para dividir os trabalhadores, retirar direitos e impedir a unidade da classe trabalhadora: o movimento reacionário.                   Desde a crise iniciada em 2008, estamos vendo a extrema direita, o fascismo crescer em vários países.

Nesse cenário, os direitos das mulheres são atacados a todo momento. Como disse Simone de Beauvoir, são os direitos das mulheres, os primeiros a serem atacados e retirados em tempos de crise econômica, política ou social. Vimos mulheres perderem direitos de décadas, como nos EUA, onde o direito ao aborto está sendo retirado em vários Estados.

No Brasil, o cenário não é diferente. Estamos enfrentando um ataque de extremistas, fundamentalistas há anos. O caso mais recente é em relação ao violento PL 1904, que está em pauta na câmara dos deputados.

No dia 12 de junho de 2024, o presidente da Câmara Arthur Lira (PP AL), pôs em votação. em regime de urgência, o PL 1904 de autoria do deputado Sóstenes Cavalcante (PL RJ), aprovando em menos de 30 segundos, o projeto que criminaliza as meninas e mulheres vítimas de estupro que fizerem aborto após a 22ª semana de gestação.

Em caráter de urgência, o PL 1904 não passará pelas comissões temáticas, indo diretamente para o plenário.

O PL 1904 foi a resposta da bancada evangélica à decisão do Ministro Alexandre de Moraes do STF, que suspendeu a resolução do Conselho Regional de Medicina que proíbe a assistolia fetal para interrupção de gravidez acima de 22 semanas. A assistolia é recomendada pela OMS em casos de aborto após esse período de gestação.

Da estratégia a perversidade

A extrema direita avança no mundo todo. Aqui temos acompanhado esse crescimento desde as jornadas de junho de 2013, quando o movimento contra aumento de passagens, abriu espaço para a extrema direita com discursos e práticas fascistas que ganharam as ruas e se fortaleceram nas igrejas evangélicas e entre católicos ortodoxos.

Rapidamente, ganharam boa parte da massa e fomentou o ódio que a classe média nutre pelo PT, pela esquerda. Ódio muito bem alimentado com o velho discurso de combate aos comunistas, às feministas e demais movimentos sociais que, para a direita “destroem as famílias”.

Estrategicamente, a extrema direita nutre o ódio aos movimentos sociais, aos partidos de esquerda e sobretudo ao PT, maior obstáculo aos interesses dos neoliberais que compõem o Congresso, travestidos de bancada da bíblia, da bala e do boi – evangélicos, empresários e defensores da liberação e uso de armas e do agronegócio.

Pautados em falsas notícias (fake News) espalhadas em blocos pelas redes sociais e grupos de WhatsApp, as lideranças da extrema direita mantêm seu público alinhado e alienado, com o discurso de ódio contra qualquer possibilidade de direitos humanos, defesa do meio ambiente e políticas sociais.

Em uma luta contra a legalidade, contra o STF e contra qualquer direito democrático, a extrema direita que forma maioria no Congresso, tenta de todo modo desestabilizar o governo, atacar direitos e impor regras ultraconservadoras à sociedade.

O PL 1904 é a última tacada nesse jogo sórdido. Sob o comando da bancada evangélica, o ataque contra o STF atinge brutalmente as crianças e as mulheres vítimas de estupro, ao propor uma pena máxima de 20 anos de prisão para quem fizer ou ajudar a fazer um aborto, nos casos de gravidez por estupro.

O PL 1904 equipara o aborto (legal em casos de estupro desde 1940) ao crime de homicídio, impondo a criança ou mulher adulta uma pena maior do que a do estuprador, que atualmente é de 6 anos.

 

Um PL de perversidade

É importante dizer que mesmo o aborto sendo legalizado em casos de estupro, gestação de bebês com anencefalia e de risco de morte materna, as mulheres encontram muita dificuldade em ter o direito de realizar o procedimento. O atendimento que deveria ser rápido, desburocratizado para garantir o procedimento em um menor período de gestação se arrasta por semanas, trazendo mais sofrimento para as mulheres. Os médicos se recusam a fazer, alegam “questões morais e religiosas” e a justiça demora a decidir pelo que já é um direito conquistado.

Para as vítimas de estupro a situação se complica por vários fatores. Primeiro, a dificuldade de a vítima denunciar a violência sofrida e ter acesso a profilaxia médica para impedir gravidez e doenças. Segundo a dificuldade de atendimento em hospitais que não são referência em atendimento à mulher, tendo a vítima que se dirigir a hospitais próximos e contar com a sorte de ser atendida.

A perversidade do PL 1904 desconsidera a situação de crianças vítimas de estupro

Crianças não compreendem a violência que estão sofrendo, não entendem os sinais do corpo em caso de gravidez. Quando a gravidez apresenta sinais visíveis, a gestação já está avançada e a família passa a enfrentar a morosidade da justiça, a má vontade de médicos, a violência dos grupos “pró-vida”, que tentam impedir o aborto legal.

O caso mais noticiado dos últimos anos foi o caso da menina do ES, estuprada pelo tio. Além de ter sido isolada em um abrigo, longe dos familiares responsáveis, foi impedida de realizar o aborto no hospital no próprio estado. Após muita luta a família foi autorizada a fazer o procedimento no Pernambuco, e só conseguiram fazer o procedimento porque o Movimento de feministas garantiu a entrada da criança no hospital.

Foi após esse triste episódio, que o governo Bolsonaro editou a portaria que dificultava ainda mais o atendimento as vítimas de estupro. A perversidade da extrema direita criminaliza as vítimas de estupro. Silenciá-las ainda mais, protegendo o estuprador. A portaria foi derrubada pelo governo Lula no primeiro ano de mandato, em 2023.

No entanto, vários municípios ainda torturam mulheres e crianças gravidas por estupro forçando-as a passar por ultrassonografia para ouvir “batimentos cardíacos do feto”, para dissuadi-las de fazer aborto. A crueldade da extrema direita não tem limite.

Foi o caso da menina e da mãe em Santa Catarina que não conseguiam realizar o procedimento pela intervenção da justiça. A juíza Joana Ribeiro Zimmer manteve em um abrigo, a menina de 11 anos, para evitar que fizesse o aborto autorizado pela lei. A magistrada negou à criança o procedimento para interromper a gestação. Felizmente, foi afastada e a criança pode livrar-se da gravidez indesejada, mas não dos traumas provocados.

Hipocrisia “pró-vida” e o controle do corpo da mulher

A extrema direita e seus seguidores, fanáticos religiosos, levantam bandeira e discurso em “defesa da vida”.  No entanto, esses mesmos defensores da vida, são os mesmos que defendem a ação policial nas favelas, que mata pobres e pretos, crianças, jovens, trabalhadoras e trabalhadores. São contrários às políticas assistenciais, são contra as escolas públicas, defendem a privatização do SUS, são a favor do trabalho infantil, das reformas previdenciária, trabalhista e da redução da maioridade penal.

São os mesmos que dizem que não pode abortar, mas que deve “doar” a criança nascida, ou abandonar os bebês em abrigos e orfanatos a própria sorte.

Claramente, só defendem a vida intrauterina. A vida, após o parto, pouco importa. Para nós, isso é um mecanismo de controle do corpo da mulher, seja uma criança ou adulta.

Para esses hipócritas, nós mulheres não podemos decidir nossa vida, fazer nossas escolhas, não podemos denunciar os homens que violam o nosso corpo. Silenciar de toda forma a mulher é o objetivo desses grupos e suas lideranças.

Reação: O movimento de mulheres de volta as ruas

Logo, após a votação, em caráter de urgência do infame PL1904, grupos de ativistas, movimento feminista de vários agrupamentos, artistas se posicionaram fortemente contrários ao PL que criminaliza a vítima, impondo uma pena maior do que a do estuprador.

A sociedade organizada se chocou com tamanha perversão da bancada evangélica, origem e base deste projeto.

 

Na sexta feira, 14 de junho, atos em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília, deram o tom da luta. Vários outros atos foram convocados pelo país e continuam acontecendo.

Falas fortes de deputadas de esquerda mostraram os números da violência contra mulheres e meninas, os dados sobre estupro e a chocante realidade da maioria das vítimas serem menores de 13 anos.

O governo se posicionou contra o projeto nas falas do Ministro Padilha e do presidente Lula, que reafirmou que o aborto é uma realidade e deve ser tratado como questão de saúde pública e que não podemos penalizar ainda mais as vítimas de estupro.

A reação ao PL ganha as ruas do Brasil. Após as primeiras reações, o Presidente da câmara Lira, que colocou em caráter de urgência esse projeto, recuou, tentou minimizar os efeitos e garantiu que será debatido e passará pelas Comissões no segundo semestre. Uma vitória do movimento!

A grande repercussão fez com  que a deputada evangélica, Renilce Nicodemos (MDB - PA) pedisse pra retirar a assinatura do PL, alegando que após ler, concluiu que o projeto está em desacordo com que ela defende para mulheres e crianças.

 

As lições do Movimento de reação ao PL 1904

Nós do Partido Comunista, sempre fizemos a análise de que estamos vivendo um momento muito difícil para a classe trabalhadora. A eleição de Lula foi importante para impedir a consolidação da extrema direita, do fascismo no Brasil, naquele momento em que Bolsonaro disputava a reeleição.

No entanto, sempre deixamos claro que a aliança de frente popular com a direita golpista traria grandes obstáculos ao governo, principalmente com o congresso de maioria reacionária que se formou. Enfrentamos há muito tempo um processo de desmobilização da classe trabalhadora e vemos nossos direitos serem retirados por emendas constitucionais, como a reforma trabalhista no governo Temer e a reforma da previdência do governo Bolsonaro.

Então, podemos perceber que o movimento preciso das mulheres contra o PL 1904 pode mudar o curso ou pelo menos barrar temporariamente essa violência.              

Após os movimentos ganharem as ruas, falas de recuo são percebidas, o próprio autor do projeto infame, o deputado Sóstenes Cavalcante disse que retira o PL, mas condicionando à retirada do processo impetrado pelo PSOL no STF, em relação à assistolia cardíaca fetal.

Somente a mobilização, a organização dos trabalhadores e trabalhadoras pode mudar o curso dos ataques que vimos sofrendo ao longo dessa crise. Em nenhum momento histórico tivemos maioria de esquerda em qualquer casa parlamentar, mas quase sempre conseguimos aprovar nossas demandas graças a mobilização e ao povo na rua. Agora, mais uma vez, a direita recuou pela mobilização. A atividade das mulheres lutadoras deu condição, inclusive, do governo se posicionar em defesa dos direitos já garantidos por lei. Vivemos um momento muito sério, elegemos um governo que enfrenta dificuldades em atender as demandas da classe trabalhadora, que está de certa forma refém do centrão, que usa qualquer coisa como moeda de troca, neste caso, retirando direito das mulheres e impondo uma crueldade as vítimas de estupro. A mobilização deu o tom da luta. É preciso fortalecer o movimento de mulheres para garantir os direitos e avançar nas conquistas.

Viva a Luta das mulheres trabalhadoras!

Viva a luta da classe trabalhadora!

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