A MÃO NA EVOLUÇÃO HUMANA
Sem que os seres humanos tenham consciência, a mão fornece cotidianamente inúmeras informações sutis sobre a forma, a natureza, o aspecto de tudo que cerca os indivíduos e sobre o estado emocional de outros seres humanos. A mão é um símbolo da práxis, um indício de os seres humanos se autocriam pela sua atividade.
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Frederico Costa
A evolução da espécie humana e de suas características sociais possui inúmeras ramificações e becos sem saída. Em determinado estado evolutivo surgiram diversas formas, em seguida uma delas supera as outras progressivamente por causa de sua maior eficácia ou por outras razões. É um processo rico e complexo, que talvez não seja possível reconstruir em todos os detalhes, mas que pelo menos pode ser possível uma aproximação de seus contornos gerais.
É fato que a fabricação e utilização de ferramentas (meios de trabalho) exerceram uma pressão evolutiva sobre a biologia do desenvolvimento da espécie humana. Essa pressão seletiva agiu sobre a estrutura da mão e da cognição, na parte do cérebro que controla a mão.
De acordo com Silvana Condemi e François Savatier (2019), a evolução das fabricações líticas (instrumentos de pedra) corresponde à evolução da própria mão. Pois, essa extremidade tão particular é um dos resultados distintivos da hominização, e a mão humana é muito distinta da “mão” de outros hominídeos. O processo evolutivo a diminuiu, o que é evidente em relação ao polegar, mas os outros dedos também, tornaram-se curtos em comparação aos dos chimpanzés, por exemplo.
A mão humana é constituída de 29 ossos, com um número idêntico de articulações, de 35 músculos e de uma vasta rede de nervos, artérias e, sobretudo, possui mais de cem tendões. As falanges humanas não são curvas como as dos macacos. O polegar humano, o mais robusto dos dedos, é opositor, e seu controle mobiliza sozinho nove músculos e três nervos principais da mão. Por causa dessas diversas ligações é que os dedos humanos se movem individualmente com tanta destreza.
Na prática, isso se efetiva nas inúmeras posições que a mão pode adotar: desenha uma forma de gancho aberto ou fechado de diversas maneiras; constitui um ponto de apoio e um instrumento de preensão polivalente, tanto em força como em precisão; serve como percutor (um instrumento usado nas indústrias líticas, ferramentas de pedra); concha para beber; instrumento de medição, entre outras funções. A mão é usada, segundo Marx (2013), na apropriação imediata do objeto na atividade coletora serve como meio de trabalho. Em síntese, é uma espécie de máquina-ferramenta inteligente, que se reprograma quase instantaneamente em função das informações coletadas pelos múltiplos captadores sensoriais de que dispõe.
Esses micros sensores fazem da mão um órgão de informação e de comunicação. A existência de numerosas fibras, sobretudo na palma e nas extremidades dos dedos – mais de dezessete mil – proporciona um tato modulado pela sensibilidade, fazendo com que por meio dela se tenha contato com o mundo material.
Sem que os seres humanos tenham consciência, a mão fornece cotidianamente inúmeras informações sutis sobre a forma, a natureza, o aspecto de tudo que cerca os indivíduos e sobre o estado emocional de outros seres humanos. Também, reflete a extensão da cognição humana. Estima-se que essas atividades mobilizem cerca de um quarto de zonas do cérebro dedicadas aos movimentos, em particular, o córtex motor (situado na parte posterior do lombo parietal), associado aos movimentos voluntários, e uma parte dos neurônios do cerebelo, desencadeando movimentos coordenados. Dessa forma, as capacidades motrizes e sensitivas da mão puderam contribuir para o aumento de nossa cognição e para o tamanho do cérebro humano.
Referências
MARX, Karl. O capital: crítica da economia política: Livro I: o processo de produção do capital. São Paulo: Boitempo, 2013.
CONDEMI, Silvana e SAVATIER, François. As últimas notícias do Sapiens: uma revolução nas nossas origens. São Paulo: Vestígio, 2019.